7.12.12

transferências

A gordinha bunduda fica irritada quando encontra alguém desleixado com a gramática, mas fica chatiadissima quando a obesidade entra em pauta na roda de piadas.

O gostosinho mano sente-se mais a vontade quando comete alguns deslizes no português, mas não suporta mulher preguiçosa e descontrolada. Não admite, mas detesta quando subestimam sua inteligência. Só por que fala errado de vez em quando.

No final das contas, ambos cometem seus ataques histéricos quando estão entre iguais. Ambos vão ressaltar a sombra do oponente. Rindo, zombando, caçoando, amaldiçoando.

O senso comum tem dito que pessoas interessantes falam de projetos - e não de outras pessoas.

Mas como falar de projetos quando você só tem acesso ao horário de lazer da maioria? 

Projetos trazem dores de cabeça, dão errado, frustram, dão margem para desentendimentos. É gostoso falar de empreendimentos quando eles ainda não nasceram, quando são somente ideias. Quando estão em execução, tudo que resta é falar dos desafios do momento. Dores inevitáveis em qualquer trabalho em andamento. Faz piada, das jocosas, quem garante manter o alto astral quando a casa está caindo. Coitado de quem segura a onda desses indivíduos como válvula de escape.

Mas quem quer saber de problemas quando não se está no meio do processo? Mais fácil atacar pedras no vizinho, ou em algum político, ou em alguma figura pública.

Falar da própria vida é complicado. Seus problemas devem ser levados para o seu psicólogo ou advogado. Alguns temas são de domínio exclusivo dos seus terapeutas. Respeito é bom, mas não existe amizade se tudo tem que estar sempre bem (ou quando insistem em fazer parecer que não há problema algum).

Há tempos escrevi sobre pessoas com infelicidade crônica. Hoje volto ao tópico para falar do oposto. Convivas que foram picados pelo bicho da felicidade plena. Aqueles que descobriram a formula (ou o elixir) do sucesso absoluto. Ah, como proliferam. Como cansam. Quantas lições de moral. Quantas dicas de quem garante que é infalível. 

Pega no meu pau, PFV.

Compartilho do gosto por usufruir de bens e experiências com exclusividade. Objetos e destinos de fácil acesso perdem o valor quando estão ao alcance de todos. 

A felicidade plena virou sonho de consumo em livros, palestras, seminários, cursos de imersão. Além de ser inverosímil, perdeu o encanto. Virou discurso publicitário para bens de consumo sem diferencial. Ser feliz não é uma habilidade, nem um direito. Acontece, quando você menos espera. Vai embora sem avisar e irá te forçar a tomar desesperadas medidas pra ver se ela volta.

Concordo que existem hábitos que reforçam o seu estado de espirito. Ficar sorrindo sem vontade ou forçar bom humor é como bater punheta de pau mole. Hora ou outra a coisa pode engrenar. Mas se não tiver jeito, não existe problema algum em curtir as trevas no temido fundo do poço. São nessas horas que descobrimos potenciais adormecidos. Quando decidimos sobreviver, sem desistir, obviamente.

Contradizendo o senso comum, pessoas interessantes são aquelas que fazem você se sentir especial, com os prós e contras de qualquer personalidade esférica. Esteja você feliz ou não. Gorda ou magra, com bom ou não português. 

Se a pessoa é interessante, vai te influenciar o suficiente para promover mudanças inacreditáveis em sua vida. Só por que você se sente especial ao lado, ou por causa dela. Simples assim.

Quem é mesmo valioso não soma, multiplica.

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